Benedita da Silva

em 3 de out. de 2019



À Comunidade Acadêmica e aos Trabalhadores da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia,

Prezadxs, gostaríamos de lhes contar um pouco sobre Benedita Souza da Silva Sampaio, mais conhecida como Benedita da Silva. Essa mulher, negra, que faz parte da composição da obra literária Vozes Insurgentes de Mulheres Negras e que tanto colaborou na luta contra a desigualdade, principalmente a racial. Essa mulher, com M maiúsculo, que não se calou quando conseguiu chegar ao poder, mas que deu voz a um povo que foi calado por muito tempo. Tão merecedora de nossa tamanha admiração por sua resistência e representatividade até os dias de hoje.
Ela nasceu em 26 de abril de 1942, na favela Praia do Pinto, no bairro Leblon. É esposa do ator Antônio Pitanga, madrasta de Camila Pitanga (que também é uma mulher símbolo de resistência) e Rocco Pitanga. Veio de uma família pobre, sendo legítima representante de seu povo por já ter sofrido com as mazelas do país desde a infância. Seu lugar de origem, por exemplo, a favela Praia do Pinto, não existe mais.
Segundo o site Cronologia do Urbanismo, desenvolvido pela Universidade Federal da Bahia, a favela da Praia do Pinto, por se localizar em uma das áreas mais valorizadas da Zona Sul do Rio de Janeiro, se tornou alvo do Governo Militar, que desejava remover aquelas pessoas em prol do “desenvolvimento urbano”. Essa favela foi destruída por um incêndio que ocorreu em um período de grande tensão, marcado por resistência de moradores, prisão de líderes comunitários e remoções em outras favelas da cidade. Sendo que até hoje as causas do incêndio não foram esclarecidas.
Sofrendo com a realidade social do Brasil, Benedita da Silva, que é ex-vendedora de limões e amendoins, percebeu que precisava voltar a estudar (já que havia parado para trabalhar e ajudar a mãe em casa) para dar continuidade à sua luta. Então, se formou como técnica de enfermagem e, posteriormente, foi a primeira de sua família a entrar em uma universidade, se formando em Serviço Social.
Desde 1983 até atualmente, Benedita da Silva tem atuado diretamente na política brasileira, emendando cargos ao longo desses anos. Já foi vereadora, a primeira senadora negra do Brasil, vice-governadora, governadora e deputada federal (cargo que ainda ocupa) do estado do Rio de Janeiro. Além disso, foi Ministra da Secretaria Especial de Trabalho e Assistência Social do Brasil, no governo Lula do Partido dos Trabalhadores (ao qual é filiada) e Secretária de Assistência Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro.
Essa importantíssima trajetória política começou com sua atuação nos movimentos de favela, movimento negro e movimento de mulheres. Foi Benedita da Silva a relatora que deu origem à PEC das domésticas e a autora do projeto de lei que instituiu o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra. Além disso, foi autora de projetos para incluir negros na televisão, em peças publicitárias e em filmes.
Com tamanho peso em seu currículo, é merecedora de um emocionante trecho, o seu pronunciamento no Senado Federal, em 21 de março de 1995, do livro Vozes Insurgentes de Mulheres Negras. Ao chegar ao Senado Federal brasileiro, ela buscou deixar clara sua visão dos problemas e prioridades nacionais, seus projetos para o Estado do Rio de Janeiro e as linhas gerais que nortearam sua atuação como Senadora da República, focando em quatro pilares primordiais: democracia, trabalho, solidariedade e justiça social.
Em sua fala, admitiu, sabiamente, que há divergências, no Senado, sobre as prioridades da Nação e que em uma democracia, divergências e debates acontecem naturalmente. Mas, demonstrou, desde o princípio, a sua preocupação quanto à gravidade e emergência da situação social do Brasil, mostrando para que estava ali ao dizer que se os problemas sociais não fossem solucionados, as políticas
econômicas de nada adiantariam.
Ainda, não se acovardando diante dos colegas do Senado e buscando representar quem a elegeu, disse que o Brasil é um país muito endividado com o seu próprio povo. Alegou que havia muitas contas a se pagar na área social, no campo das relações raciais e na esfera cultural, pensando não somente no caso das pessoas negras, mas abrangendo um geral de crianças, adolescentes, idosos e mulheres.
Benedita foi pontual ao falar que, nas crises econômicas, os prejuízos são tidos como algo para toda a sociedade, que tem o dever de ajudar seu país a se recompor. Porém, em período de desenvolvimento, os lucros são privatizados, indo apenas para uma pequena parcela da população.
Na época desse pronunciamento, o país ainda padecia mais do que os dias atuais (segundo os apontamentos das estatísticas) com a fome. Não se esquecendo disso, ela associou o quadro de desnutrição e doenças com um contexto psicossocial “tenso, explosivo, discriminador, violento e autoritário, no qual a vida perde gradualmente seu valor”.
Após essa correlação, Benedita da Silva ainda enfatizou a dívida histórica que o Brasil possuía, pautada no Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial que foi, coincidentemente, o dia de seu pronunciamento, 21 de março. Dessa forma, mais uma vez, se demonstra a importância de sua luta até os dias atuais, em que essa dívida histórica ainda parece bem longe de ser quitada.
Dentre suas inúmeras causas, Benedita da Silva ainda ressalta que em seus mandatos como Deputada Federal apresentou projetos em defesa não só dos direitos do negro, mas também em defesa do índio e do imigrante nordestino, entendendo que a discriminação racial também atinge muito a esses povos.
Já finalizando sua fala, ela demonstra inúmeras contribuições de pessoas negras em diversas áreas, para demonstrar que a falta de reconhecimento ao trabalho deles não diminuía sua importância e a grandeza de seus feitos.
Por fim, sua sugestão para que houvesse um maior respeito, a erradicação da discriminação racial, uma verdadeira democracia e uma unidade nacional, foi a realização de um grande diálogo multirracial. Assim, a representatividade poderia ter a chance de conseguir uma nova era para o Brasil, pautada na equidade.
Outrossim, faz-se fundamental falar sobre a relevância de Benedita da Silva para os estudos jurídicos. Diante de todos os fatos supracitados, discorreremos sobre as suas contribuições para o Direito. Além dos seus projetos a favor da ampla defesa da igualdade racial, também apresentou propostas que conferiam uma série de direitos e garantias às pessoas com transtornos mentais, o que demonstra que as lutas de Benedita não se limitam, fica evidente que a pauta dos direitos humanos é uma das suas prioridades mediante as ações que promoveu e promove em todos os cargos públicos que já
exerceu.
Destarte, a atual deputada federal ainda escreveu algumas obras que corroboram os seus eixos de trabalho social, dentre elas está o livro “O papel da mulher na ação comunitária nos segmentos carentes da população”.
Essa obra evidencia o lugar de fala de Benedita da Silva, o lugar de onde ela veio e as ações que ela, como mulher negra, pode executar nestes lugares. Em entrevista para o site HedflowTV ela é incisiva e afirma: “enquanto eu tiver suor, enquanto Deus me der vida e saúde, eu vou lutar pelo meu país, porque eu acredito nele, sei do seu potencial, e sei sobretudo de onde eu saí, e não foi de um lugar bom, e vou lutar pra que outros não tenham que terminar naquele lugar em que eu estive”.
Diante da atual conjuntura sociopolítica brasileira, esta grande voz insurgente não pretende se calar, ao se referir à reforma da previdência desenhada por Paulo Guedes, na mesma entrevista, ela diz que: “Essa reforma representa a volta da escravidão, eu já saí do tronco e não pretendo voltar, já tenho 77 anos e não vou voltar ao tempo das chicotadas, não vou”.
Estamos falando de uma mulher que conhece a pobreza e não quer permitir que grupos sociais permaneçam nessas condições, que utiliza do seu lugar hoje para modificar o que precisa ser alterado nesses segmentos, é importante perceber que sua relevância social e intelectual também é indubitável.
Além do livro citado anteriormente, Benedita é autora de diversas outras obras, como “Em defesa dos Trabalhadores e Movimentos Populares”, “Cidadania: uma questão a ser resolvida”, “A situação de crianças e adolescentes brasileiros”, Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial”, “Nação da Discriminação Racial”, “Direitos e Deveres de Empregados e Empregadores”. Outro fato de importante destaque acerca desta mulher é a sua luta pela causa das domésticas brasileiras. Como já exposto, ela foi a relatora do projeto que deu origem à PEC das domésticas, além de dedicar alguns de seus livros para esta vertente. Sua significância para tal movimento é ímpar.
Dessa forma, a partir dos fatos elencados, pode-se concluir que é de grande importância, para as ciências sociais e para o Direito, estudar Benedita da Silva e as suas contribuições para os mais diversos segmentos da sociedade e as discriminações legislativas defendidas pela mesma. Além disso, a sua obra literária é de grande valia para as discussões no âmbito acadêmico, falar sobre a eliminação da discriminação racial é o principal caminho para a sua efetivação, reconhecer que as trabalhadoras e trabalhadores domésticos precisam ter os seus direitos afirmados e defendidos diante de toda a sociedade é um passo a mais na luta contra os resquícios da escravidão que permeiam a nossa constituição, a ampla defesa dos trabalhadores em geral é essencial para que a classe se mantenha firme diante das graves ameaças que os seus direitos sofrem com as medidas e reformas propostas e realizadas. Benedita da Silva é símbolo de luta, é a resistência e a representação da mulher preta no poder que não vai permitir o retrocesso.

At.te,

Lysia Ribeiro Silva e Kelly Silene de Santana

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